Pensamentos sobre tirar a própria vida

Suicídio é um assunto carregado polêmica, sobre o que muitas especulações são tecidas

Ao pronunciar a palavra tabu imaginamos algo intocável, que não se pode conversar muito, pois atrai mau agouro, objeto proibido e temido que envolve uma crença quase que demoníaca. Freud (1913/2012, p. 48) diz: Nessa palavra e no sistema que ela designa se exprime algo da vida psíquica, algo cujo entendimento ainda não está ao nosso alcance.

A palavra suicídio permanece tabu em nossa sociedade e essa regra de silencio esgarça. Por isso, se propõe conversar sobre.

No entanto, em relatos no consultório, os pacientes que passam pela experiência de querer tirar a própria vida têm uma fala quase que unânime: O que se quer é arrancar a dor que mortifica a vida.

A morte que lhe trará a paz na “vida” e, contraditoriamente, se busca a vida na morte, isto é, um querer viver bem sem tanta angústia e tristeza.

Peres (2014, p. 100/101):

psicanalistas e poetas nos falam e respondem sobre a dor de existir. Uma perda eterna, atemporal em seu acontecer, em que o limite entre passado e futuro torna-se indistinto pela presença constante de uma falta, sinalizando a particular relação da melancolia com o tempo, tempo que faz pacto com a morte.

Ater-se na dor de existir, procurando causas específicas, levará a padronizar dor, motivos e histórias. Cada um tem uma dor de ser, uma situação de vulnerabilidade social, econômica, política, tecnológica que, por vezes, parece um buraco. A mente invadida de tanta história ruim leva ao desespero de querer cortá-la fora. Segundo a Organização Mundial de Saúde, uma pessoa morre no mundo a cada 40 segundos pela lesão auto provocada intencionalmente ou por enforcamento, estrangulação, sufocação, ingestão de remédios, assim por diante. O suicídio é a segunda principal causa de morte entre jovens com idade entre 15 e 29 anos.

Nisso tudo cabe quebrar tabus. Trazer o amor para compor essa luta contra a dor e no caso da dor psíquica intensa, estar com o outro é a condição humana que pode diminuir o sentimento de um vazio tão profundo. O sentimento de estar acompanhado de solidariedade: em definitivo, sofrer com pessoas amigas ao redor pode gerar conforto.

Segundo Gaziri (2020, p.83): Pesquisadores da universidade do Oeste de Ontário, no Canadá, revelaram que quando estamos próximos daqueles com quem nos damos bem, ficamos mais bem-humorados e somos mais criativos.

A depressão, registra a OMS, é o diagnóstico mais comum em suicídios consumados e a maioria não procura um profissional de saúde mental (psicólogo e psiquiatra).

Considera-se nesse texto que dialogar sobre os acontecimentos perturbadores da vida é visto por muitas pessoas como um tabu, por razões variadas, entre elas um sentimento de que pode contaminar. Estar desanimado, sem forças, sem sorriso, foge ao padrão da “estética da felicidade”, presente no império da rede social onde não há perdão para os fracassados dos likes. Muitos podem continuar achando que a vida é absurdamente sem sentido, no entanto, isso pode abrir um punhado de possibilidades de achar o sentido dela. É preciso tocar nesse assunto em família e nas redes sociais, pois o sofrimento está presente, mas nenhum pensamento intrusivo, confuso e carregado de dor é definitivo.

Tem saída.

Referências

FREUD, Sigmund (2012). Totem e tabu. In Obras completas, volume 11: Totem e tabu, Contribuição à história do movimento psicanalítico e outros textos (1912-1914). São Paulo: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1913).

GAZIRI, L. Os sete princípios da felicidade. São Paulo, Faro editorial. 2020.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Prevenção do suicídio: um manual para profissionais da saúde em atenção primária. Genebra, 2000.

PERES, Urania Tourinho. Uma ferida a sangrar-lhe a alma. In: KEHL, Maria Rita (Org.) Luto e melancolia: Sigmund Freud. São Paulo: Cosac Naify, 2011, p. 101-137.

Crédito da foto: Yosef Morenghi, 2019.

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