Odisseia desvairada 2022

Viagem cheia de aventuras incongruentes e bonitas. É assim a cadeira de um psicólogo ou o divã de um psicanalista.

Iniciou-se 2022 e a cabeça fica cheia de sonhos, metas, ideias, energias. Atualmente, fala-se em saúde mental nas redes sociais o tempo todo; virou moda. A ciência da felicidade invade, mas as escolhas ainda são bem complicadas, pois a teoria do ser sempre positivo e alegre, na prática, é outra.

Um paciente que pensa em iniciar a terapia procura um profissional que o ajude. É comum definir qual linha de trabalho psíquico se encaixa, pode ser: Reichiana, Filosófica, Junguiana, Cognitivo Comportamental, Psicologia Positiva, Psicanálise, Psicologia Existencial, Hipnose e outras. Contudo hoje em dia tem até gente acreditando no Tarot Simbólico Freudiano e enxurradas de pessoas fazendo cursos de terapia com promessas mágicas, como o “Minicurso de Terapeuta de Resultados” oferecido por um senhor chamado Jair Soares. Admitir que qualquer pessoa pode se tornar terapeuta é equívoco, chega a ser vulgar. Pregam por aí uma escuta que parece ser simples e fácil.

Também passa pela banalização ver vários psicólogos recorrendo ao showbusiness no Instagram ou no Tik Tok, destilando suas performances para ganhar seguidores e, assim, vira-se uma grande Santa Fogueira.

Todavia, este artigo está direcionado, além da crítica, para os pontos a serem considerados na escolha da (o) psicoterapeuta pelo candidato a paciente para se proteger desse desvario, cuidando de escolher uma linha de trabalho com apreço, assegurado já um autocuidado, um ato de amor-próprio. A construção dos pensamentos é composta de numerosos elementos interligados e, por isso, a apreensão daquilo que o paciente quer dizer exige atenção, escuta aperfeiçoada e ética. Na psicoterapia, os desejos encadeados serão recordados e poderão ser revelados, assim, elaborados para poder ficar contente com a própria escolha. Tudo isso, reforça-se aqui, passa por uma escuta apurada e pela ética. Diz Kehl (2002, p.109):

“A virada freudiana consistiu em fazer valer, pela disposição de Freud em escutar seus pacientes, uma palavra que até então vinha sendo jogada fora por médicos, cientistas, considerada vazia de sentido – a palavra exuberante das histéricas, o delírio dos paranóicos, as construções absurdas dos obsessivos.”

Sim, a psicanálise cura, parafraseando Nasio em seu livro com o mesmo nome. Sim, a psicoterapia cura quando realizada com profissionais preparados e que seguem preceitos de ordem valorativa, conexos e com bons princípios.
Escreve Nasio (2017, p.26): “O psicanalista observa, trata de compreender, escuta plenamente, se identifica e, por fim, comunica sua interpretação”.

A fina escuta mostra os elementos ocultos e subjacentes ao relato do paciente. Os sonhos, chistes e atos falhos, a livre associação, as falas no consultório nos trazem informações que podem localizar microfraturas traumáticas ou traumas profundos. A dupla (paciente e analista) viaja junto e descobre coisas inimagináveis, numa Odisseia, numa imersão no interior de si, acessando poderosamente essas dores em busca da cura por si próprio e um pouco da cura do mundo.

Referências

KEHL, Maria Rita. Sobre ética e psicanálise. São Paulo: Companhia das Letras, 2002

NASIO, Juan-David. Sim, a psicanálise cura. Rio de Janeiro: Zahar, 2019

Crédito da imagem: “Meditative rose”, Salvador Dalí

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