A morte ronda, a dúvida apavora, aterrorizados estamos. A existência em transição e a mudança abrupta que nos tira de um território seguro.
Inicio com a inspiração do texto do professor Safra (2005, pg. 117), “Como já afirmei, em outro momento, o ser humano surge no mundo por meio de uma organização subjetiva do tempo, do espaço e da corporeidade.”
O mundo e a sensação.
Qual a sensação do seu mundo atual? A casa onde vive fisicamente e seu mundo atual: sua casa mental, interior.
Suponho que a dimensão subjetiva está nos levando, nesse momento, a viver em uma realidade que não estamos acostumadas e acostumados, pois tentamos acessar o corpo a todo instante, desesperados por fazer algo. Fazer, fazer e fazer, assistir filmes, acessar lives, abrir as redes sociais, realizar atividades, não esquecer do corpo, respirar, relaxar e fazer.
São muitas as transformações no dia-a-dia pois o tempo de Covid-19 nos mudou, e até confundimos o calendário, pois de sexta-feira, não sextou mais e as segundas são meio iguais.
Confusão… O que fazer em meio a esse caos? As perguntas chegam a todo instante no meu divã online: quando vai acabar tudo isso e o que devo fazer agora? E se você não fizer muito, tentar observar, absorver, e sentir o próprio caos? Enfrentar os fantasmas, aceitar um pouco o novo movimento, reconhecer novos terrenos, olhar os detalhes de sua casa, de seu livro, da sua poesia, buscar um pouco do ócio, do silêncio e dar a oportunidade de sentir essa dor, aceitando a sua angústia. No texto Inibição, sintoma e angústia, (2014, p. 91), Freud diz:
Procuremos por um instante substituir o afeto da angústia por outro, a dor por exemplo. Achamos inteiramente normal que uma menina aos 4 anos de idade chore penosamente quando sua boneca é quebrada; aos 6 anos quando a professora lhe faz uma recriminação; aos 16 anos quando o namorado não lhe dá atenção; e aos 25, talvez, quando lhe morre um filho. Cada uma dessas condições para a dor tem seu tempo e acaba quando ele passa.
A psicologia entende esse sofrimento e a psicoterapia busca condição para que você resolva esse sofrimento. Você também pode fazer sua parte buscando essa superação da melhor forma possível, então, não se cobre para ficar bem; pode passar um pouco mal. Preste atenção nos detalhes, não tenha medo de falar de morte, faça, sim, exercícios físicos e aceite o seu jeito de ser agora.
Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura.Guimarães Rosa
Referências
FREUD, S. Inibição, sintoma e angústia (1926). In Obras Completas [tradução Paulo César de Souza]. São Paulo: Companhia das Letras, 2014, vol. 17, p. 91.
ROSA, J. G. Grande sertão: veredas. 3a ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1965.
SAFRA, G. A face estética do self. 9a ed. Editora Ideias e Letras, 2017.
Crédito da imagem: A árvore da vida, Stoclet Friso, 1909 por Gustav Klimt (1862-1918, Austria), retirado de WahooArt.com.
Tão importante e potente estas palavras, especialmente nestes tempos de cobranças do fazer em detrimento do ser. Até no isolamento somos cobrados a produzir. Não obstante, quando tudo isso passar, nas entrevistas de emprego, os entrevistadores certamente nos perguntarão: “que habilidades você desenvolveu durante a quarentena?”.
No meu caso, só saberei dizer, tentei cuidar de mim e dos meus.
O fazer para sobreviver…
Fico aqui com a palavra cuidar. Cuidados com amores (família). Ter cuidado e cuidar – palavra sem limites.
“O amor é fogo que arde sem se ver.” Camões